quinta-feira, 23 de junho de 2016

Blackning pesado


Gostaria de saber quão desafiador foi preparar o segundo disco. Acredito que seja muita responsabilidade superar um trabalho de estreia, não?
Não saberia dizer ao certo se podemos chamar isso de responsabilidade. Fizemos o nosso primeiro álbum ("Order of Chaos") em 6 meses, dos primeiros ensaios de Janeiro de 2014 ao início das gravações em Junho daquele ano. Estávamos com a gana por fazer algo que representasse nossas ideias e servisse como nosso cartão de visita, sem a necessidade de divulgarmos alguma demo ou EP inicial, queimando cartucho. Sabíamos que era possível chegar com algo, de certa forma, relevante entre as bandas do estilo e nos propusemos a correr tal risco. Lançamos no Brasil o nosso debut album em Dezembro de 2014 e o saldo por parte da mídia, tanto daqui quanto da gringa, foi muito positivo.
Ao começarmos a pensar no segundo álbum, que veio a se chamar "ALieNation", fizemos tudo com mais tranquilidade e dessa vez tivemos o envolvimento da banda toda, diferente do primeiro álbum que foi composto basicamente por duas pessoas (por Elvis Santos - baterista da banda - e por mim, pela questão de não termos baixista na época da composição do "Order of Chaos - Francisco Stanich entrou na banda no início das gravações de bateria). Isso trouxe uma unidade única ao grupo e ao novo trabalho, uma dinâmica diferente e favorável para que fizéssemos tudo com mais consciência e experimentação para que tudo soasse bem aos nossos ouvidos, da forma que imaginávamos e que foi previamente trabalhado com o produtor musical Fabiano Penna (o mesmo que produziu o álbum anterior). Por isso tudo não sentimos um peso em fazer algo maior, e sim em fazer algo que fosse a cara da banda nessa fase atual. A superação que você comentou foi sentida apenas na parte de execução musical de cada um, na produção dos sons, na mixagem, masterização e parte gráfica, e acredito que nesses quesitos a gente conseguiu dar um passo além.

Quanto tempo levou para fazer esse trabalho?
Começamos a nos reunir para compor esse novo trabalho por volta de abril e maio de 2015, quando mostrei as minhas primeiras novas ideias pro pessoal. Fomos lapidando algumas coisas e criando muitas coisas do zero, no formato dos três caras mesmo, somando com as várias ideias do Elvis e do Francisco, ensaiando bastante, gravando prés e trabalhando junto com o produtor Fabiano Penna. Somando todo esse processo, posso considerar que levamos um total de 14 meses, sendo 9 meses de composição, 1 mês de pré-produção, 3 meses de gravações e 1 mês de mixagem e masterização, tudo isso ensaiando no paralelo. Gastamos quase meio ano a mais (5 meses) que o primeiro álbum e isso foi ótimo para fazermos tudo da forma que achávamos correto para esse trabalho, sem pressão ou correria.

Você costuma escutar outras bandas antes de fazer um disco assim para ter inspiração?

Particularmente, não. Me preocupo muito em trabalhar focado, evitando interferência externa na composição. Às vezes ao se buscar referências artísticas externas, você pode acabar se deixando levar e fugindo do caminho natural do seu trabalho, principalmente se as referências forem muito próximas ao seu estilo. Escuto muita música no dia a dia e quem me conhece de perto sabe que sou um cara bem aberto à música boa, indiferente do estilo, e isso por si só já ajuda a direcionar as ideias e coisas novas. Como escuto metal desde meus 12 anos, não tem perigo de eu tocar algo que fuja do estilo que está tão inserido no meu paladar musical, digamos assim. A inspiração pra mim pode vir de um ambiente, de uma situação, de algo visual, não tanto de novas referências musicais externas, sabe?

O disco é todo independente? Se sim, como é seguir nesse formato de trabalho, apenas com recursos próprios? O que há de positivo e de negativo?
Independente somente na parte de custeio de produção, ensaios, gravação, mixagem e masterização. Fazemos questão de termos domínio sobre o nosso trabalho, de podermos oferecê-lo para os selos que quisermos, tanto daqui quanto de fora. Sei que é redundante mas o ruim ter de utilizar recursos próprios para fazer a banda avançar é o fato de termos de usar mesmo grana própria, seja tirando do caixa da banda ou do bolso de cada integrante. Banda nova não possui um fluxo de caixa considerável para reverter nos custos internos e isso, pensando em empresa, tem de sair de algum lugar, e muitas vezes essa diferença sai do bolso dos donos do negócio, que no nosso caso leia-se "integrantes da banda". O positivo com certeza é a liberdade para barganhar melhores condições em todas as esferas. Podemos oferecer o álbum para selos gringos com condições melhores do que se tivéssemos apenas uma demo, torcendo para que eles investissem na banda, na gravação, produção, ente outras. Foi assim com o nosso primeiro álbum, que saiu na Europa por um selo da Espanha (Hecatombe Records). Na real, você tem que acreditar na tua ideia primeiro do que os outros, inclusive fazendo com eles se encorajem à acreditar em você após sentirem que é verdadeiro. E o feito é melhor do que o perfeito, ou seja, a banda tem de arregaçar as mangas e ir pra cima, sem esperar que algo caia do céu. Sobre a prensagem do "ALieNation", ela ficou por conta do selo paulistano Vingança Music, que lançou também nosso primeiro álbum, e a distribuição ficou por conta deles com a parceria da Voice Music. Acredito que todos as novas bandas, e incluo nesse ponto a Blackning por termos apenas 2 anos de vida (mesmo com 2 cds lançados e duas turnês nacionais na bagagem), tem que fazer acontecer por seu próprio mérito para, aí então, estar apta a chamar atenção de alguém. Gravadoras são nada mais do que bancos que investem uma grana num artista esperando um retorno, e ficar atrelados 100% à bancos não é tão bacana quanto possa aparecer.

Vocês são preocupados com timbres, prezam por bom resultado de gravação, fazem clipes. Como é dar conta de tudo isso? São só vocês três fazendo tudo?
É muita correria e isso nos cobra que sejamos regrados para não deixar passar nada batido. Na Blackning trabalhamos com cronogramas anuais, que desmembramos inclusive em tarefas diárias, com itens dedicados para cada integrante. Ou é assim, como uma empresa, ou o trem sai do trilhos. Sempre temos pedras no caminho de nossas vidas particulares que temos que ultrapassar, mas aí alguém na banda cobre o outro para que tudo continue andando. E assim, na parceria, a parada vai indo. E nisso falo apenas das partes burocráticas, vender shows, organizar logística, cuidar de estoque de merchandising, envio de material por correio, marcar ensaios, etc. Ainda temos a parte de ensaiar, praticar, viver a música mesmo, saca? Por hora, a banda cuida dessa parte toda, mas temos parceiros na parte de assessoria (Agencia 1A1), que era o nosso gargalo e que nos ajudam com entrevistas, notas na mídia, redes sociais, etc. Somos apenas três rapazes latino-americanos tentando tocar seu próprio negócio que tanto amam, mas sozinhos ficaria bem difícil. O sonho geral dentro da banda é cuidar apenas da música, ensaiar, compor, tocar ao vivo, etc, mas sei que nos moldes atuais do mercado musical, essa opção está descartada.

E por falar em clipe, esse disco terá algum?
Terá sim, pelo menos dois. O primeiro já foi gravado pelo nosso amigo de longa data Denis Di Lallo, que produziu inclusive nosso primeiro clipe (da música "Thy Will Be Done", do primeiro álbum, "Order of Chaos"). Escolhemos a música "Mechanical Minds" para abrir os trabalhos por causa da temática e por mostrar outra faceta da banda, um som mais cadenciado, de pegada. O clipe está atualmente na parte de edição, mas em breve iremos divulgar o trabalho e esperamos que a galera curta. 

O nome do disco faz relação a algo que você enxerga na sociedade como um todo hoje?  Como você vê o sistema em que vivemos hoje?
Ao meu ver esse álbum aborda fortemente o momento da sociedade, que é de alienação. Pessoas estão alienadas em seu celular, num tipo de autismo funcional, em suas redes sociais e seu voyeurismo, em suas vinganças, em seus rancores, em seus ideias políticos, preconceitos, etc. Ao começarmos a desenrolar a parte lírica do álbum, vimos que tudo que escrevíamos tomava esse caminho temático e aí decidimos usar o nome 'alienation' (alienação em inglês) para o álbum, mas brincando com as palavras, fechando em "ALieNation" (alienação + lie = mentira + nation = nação, ou seja, uma nação alienadora e mentirosa). Atualmente o povo acredita em tudo que vê e lê, não contesta, não tenta forçar a vista e o entendimento para ir além do contexto que cospem para os ares em forma de notícias e opiniões. Isso é horrível pois vejo amigos debatendo temas e desfazendo amizades por diferentes ponto de vista, pessoas perdendo negócios por ideais diferentes, enfim, o povo está com a vista turva ocasionada por essa nuvem que se instaurou no ar. Espero que logo menos consigamos todos enxergar que a mudança no sistema começa por nós, aqui debaixo e que todos estão por aqui apenas para viver da melhor maneira possível, de preferência sem afetar negativamente a vida alheia.

Sua música serve para alertar de problemas sociais?
Nossa música serve sim, mas não nos prendemos somente à isso. Música é arte, feita para ser apreciada. Pode ser contestadora sim, mas acredito que ela deva ser os dois. Particularmente não curto música feita somente para servir de alerta à alguém, pois acho que a música é mais do que isso. Ela tem de passar uma sensação, seja ela qual for, amor, vitória, raiva, medo, etc, e com isso entreter de alguma maneira, como um filme e fazer o ouvinte a pensar. Pensando nisso, inclusive, fizemos algo bacana no álbum novo, como diferencial, que foi inserir QR Codes de todas as letras no encarte, que levam as traduções, exatamente para o ouvinte vivenciar uma experiência mais completa e sacar a ideia da banda.

Qual a canção mais forte desse disco, em termos literários, na sua opinião?
Por gosto pessoal e em termos apenas de letra, gosto muito da "Thru the Eyes", que reflete aquele autismo funcional que comentei anteriormente, daquelas pessoas que vivem no celular, nas redes sociais e se esquecem da vida real, e curto muito também a letra da "Mechanical Minds", que fala de uma pessoa que sofre a imposição da vida em seguir o mesmo caminho de todos, do sol a sol, trabalho fixo, casa própria, etc, o fato de ter de seguir a manada para ser considerado normal. Mas com certeza cada letra mexerá de forma diferente para cada pessoa, e essa é a ideia, a interpretação pessoal de cada tema.

Qual a principal mensagem que quer passar com esse trabalho?
Se analisarmos a capa, verá que existe uma conexão com nosso primeiro álbum. Desde aquela época falamos de uma Ordem que domina o mundo, controla governos, o mercado, o dinheiro e a população. A ordem, simbolizada pela caveira nefasta, segura uma criança, que pode ser considerada a sociedade e que será doutrinada por essa ordem, de modo a ser manipulada desde o berço. No primeiro álbum (Dezembro de 2014) a ideia tratava exatamente da implantação do caos que chacoalha o mundo, os países e os líderes. Os temas abordavam quase que na sua totalidade os assuntos relacionados à isso. Já nesse novo trabalho (Junho de 2016), novamente falando da capa do álbum, a criança que simboliza essa nova sociedade cresceu, já está sendo doutrinada, alienada pela ordem e se vê debaixo das asas dessa maldade toda. No fim, os temas acabaram sendo bem atuais e no 'timing' certo que vivenciamos no dia a dia, mas sei que o mesmo nunca ficará datado.

Qual a maior dificuldade que sua banda enfrenta para divulgar seu trabalho?
Acho que as mesmas dificuldades que muitas bandas passam, inclusive as com mais anos de estrada do que a gente. Na nossa região das sete cidades, acho que seria legal falar da questão de espaço e condições ideais para apresentações do estilo. Bares de rock existem, mas preferem dar atenção à bandas covers pois o público comparece e injeta grana no negócio local. Por aqui, eventos de bandas autorais acabam ficando em segundo plano, o público fica aquém do esperado e desanima os organizadores que fazem acontecer por conta própria. Ao mesmo tempo, a Blackning, e falo também por mim em específico e pelo Elvis, nunca tivemos oportunidade de tocar em eventos públicos da nossa própria cidade, Santo André, ou de outras cidades da região, como São Bernardo e São Caetano, eventos esses organizados 100% pela prefeitura e seus departamentos de cultura. Acho curioso, pois o que sempre fizemos foi deixar material completo nesses departamentos, mas ao mesmo tempo faz com que sigamos na contra mão, fechando turnês nacionais e futuramente dando passos ainda maiores, buscando sempre o crescimento da banda, nem que para nossa própria região o reconhecimento deles venham de fora para dentro. Espero que a questão de tocar na região mude, mas também não será essa questão que irá atrasar os nossos passos, de forma alguma. Seguimos na luta com as cartas que temos na mão.

Quais os próximos planos?
Estamos no momento em turnê nacional. Já tocamos nos últimos dias em Porto Velho/RO, Rio Branco/AC, Belém/PA, Imperatriz/MA e Parnaíba/PI, voltamos para São Paulo para cumprir com alguns compromissos e entrevistas e agora no dia 24/06 subiremos novamente para mais uma perna da turnê, passando por Fortaleza/CE, Mossoró/RN, João Pessoa/PB, Cruz das Almas/BA, Serrinha/BA, Esplanada/BA e Paraisópolis/MG. Tem sido muito legal passar por alguns lugares que tocamos anteriormente, mas tocar em novos locais é tão legal quanto. Ainda temos algumas regiões a atacar, como centro-oeste e sul e a ideia é resolver essa questão em breve.  Para esse ano ainda, estamos fechando também algumas parcerias e temos o intuito de fazer algumas datas pela América do Sul, como Argentina, Chile, Peru, Bolívia, Paraguai, etc, seja como banda principal em eventos menores ou como suporte em eventos maiores. E depois, no começo do ano que vem, algo pela Europa. Estamos organizando o cronograma semestral e esperamos viabilizar tudo o mais breve possível.

Quer dizer algo mais?
Quero aproveitar e convidar à todos que confiram nosso trabalho pela web, acessando o site  www.blackning.com, onde poderão acompanhar todas as nossas novidades, músicas, vídeos, datas de shows e conferir nosso material à venda, camisetas, CDs, adesivos e tudo o mais. Em breve esperamos tocar por aqui, para assim mostrarmos à que viemos e assim revermos todos os amigos que nos apoiam há anos. Obrigado novamente e nos veremos na estrada.

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